O escândalo de Pedrógão Grande é muito maior do que se imaginava e pode envolver diretamente a atual vice-presidente da autarquia, Margarida Guedes. Uma investigação da TVI detetou mais 30 novos casos suspeitos de casas que arderam na tragédia do ano passado e que foram reconstruídas ilegalmente.
Em causa estão habitações devolutas antes do incêndio, segundas habitações transformadas em residências permanentes, casas construídas de raiz onde antes existiam ruínas, barracões a darem lugar a novas habitações. Valeu tudo em Pedrógão Grande.
A prima da vice-presidente da autarquia poderá ter sido favorecida ao beneficiar da reconstrução de uma casa onde não vivia na altura do incêndio e admite mesmo ter mentido com ordens claras da autarquia.
Na aldeia de Campelos há pelo menos três novos casos suspeitos. A cerca de 100 metros da casa onde a vice-presidente da câmara vive com a mãe, fica a casa do irmão e da cunhada. E, ali mesmo ao lado, a casa da prima da vice-presidente.
Na reportagem, podemos ver no levantamento efetuado pelo Instituto Nacional da Habitação, logo após o incêndio, que esta última casa foi classificada como sendo uma segunda habitação. Uma informação que a autarquia de Pedrógão fez tábua rasa, dando-lhe prioridade na reconstrução, apesar de saber que a prima de Margarida Guedes vive e sempre viveu numa outra aldeia.
Outra das casas suspeitas é um anexo devoluto, antes do incêndio, transformado numa casa. O proprietário ganhou assim uma nova casa, ao lado da habitação onde sempre viveu. A reconstrução do anexo irá custar a todos nós, contribuintes, cerca de 73 mil euros.
Outras casa polémica está classificada como segunda habitação nos registos do IHRU, cuja reconstrução irá custar qualquer coisa como 95 mil euros. Na aldeia todos sabem que a proprietária vive em Lisboa, inclusivamente a mãe da vice-presidente da câmara.
Já em Pobrais, fala-se da casa dos pais de um dos mais importantes empreiteiros da região, responsável por grande parte das reconstruções das casas que arderam na tragédia do ano passado. É mais um caso de uma segunda habitação transformada em residência permanente, quando na verdade os proprietários vivem na casa ao lado.
Em Aldeia das Freiras, há uma casa que está praticamente concluída e que foi construída de raiz num local onde antes do incêndio existiam ruínas. Os registos do Instituto da Habitação e as imagens de street view captadas antes da tragédia, não deixam margem para dúvidas.
Somam-se os casos polémicos. Uma outra habitação, em Vila Facaia, nem sequer ardeu, como também atestam os registos do instituto.
Na Mó Pequena, barracões destinados a garagem e arrumos antes do fogo, dão lugar a uma nova casa, paga pelo fundo Revita, pelo valor de quase 40 mil euros. Uma quantia inexplicável para obras como esta. Há outra casa devoluta antes da tragédia, mas que agora está a ser reconstruída por um valor estimado de 96 mil euros.
Ainda outra, nas Várzeas, que é mesmo um dos casos mais escandalosos dada a sua dimensão: a maior a ser reconstruída na zona, com um projeto que aponta para nove quartos e um possível turismo de habitação. As obras continuam, apesar de ter sido classificada pelo Instituto da Habitação como sendo uma segunda residência. A obra está orçada em cerca de 110 mil euros.
Em Troviscais Fundeiros, há uma casa que é a casa da discórdia. Na aldeia, todos sabem que é uma segunda habitação. Na rua de baixo, há uma primeira habitação que ardeu e ainda está à espera de ser reconstruída. Mais de um ano e meio depois da tragédia, a proprietária vive numa casa da câmara cuja renda é paga pela segurança social.
Figueira é uma aldeia que também não é exceção. Mais um exemplo: antes do incêndio, existia uma habitação devoluta, identificada nos registos do IHRU. Mas a autarquia de Pedrógão deu-lhe prioridade na reconstrução pelo valor de 67.500 euros, mesmo sabendo que a proprietária vive e sempre viveu na casa da frente.
Nesta reportagem, revelamos ainda outros casos suspeitos, como o de Aldeia do Mosteiro, onde todos sabem que uma casa há muito que estava devoluta (como comprovam os registos do IHRU).
Dez arguidos
Para já, foram constituídas arguidas dez pessoas.
- Augusto Neves, irmão do presidente da junta de freguesia de Vila Facaia. À TVI admitiu que mentiu a pedido do ex-vereador Bruno Gomes para beneficiar da reconstrução de uma casa há anos em ruínas.
- José Ferreira David, ex-presidente da junta da Graça, atual presidente da Assembleia de Freguesia.
- Carminda Moreira, sogra do presidente da junta de freguesia da Graça, é outra das arguidas.
- Laura David Batista, o caso da Figueira também denunciado pela TVI, em que um antigo palheiro foi transformado em habitação permanente. Na Figueira, há ainda outra arguida: Ilda Pegacho.
- Sogro de Paulo Pires, topógrafo na câmara de Pedrógão, foi constituído arguido. Ele que, já depois do incêndio, mudou a morada fiscal para uma casa onde nunca viveu.
- Maria de Fátima Nunes, que ualterou a morada fiscal já depois do incêndio. Esta é a casa que foi favorecida.
- João Manuel Caetano é o sétimo arguido. Há muito que vivia em Penela. A nova casa está a ser feita no Outão.
- Fernando Lopes, o homem da GNR que vive em Lisboa, irmão de um funcionário da câmara de Pedrógão: a casa beneficiada está a ser reconstruída na Mó Pequena.
- Eduarda Lopes Lourenço, prima da vice-presidente da câmara de Pedrógao Grande. Aponta também o dedo ao então vereador Bruo Gomes e à atual vice-presidente da câmara de Pedrógão.
Até ao momento, nenhum dos responsáveis políticos foi ouvido.